14/11/2020 às 11h21min - Atualizada em 14/11/2020 às 11h03min

DIGA-ME COMO VOTAS E TE DIREI COMO PENSAS.

O pensar na experiência de votar.

Marcelo Moya

Marcelo Moya

Psicanalista, membro do Instituto Ékatus da Escola Paulista de Psicanálise.

Marcelo Moya
 
O sistema democrático (demos – povo, kratos – poder), poder que emana do povo, surgiu na Grécia Antiga do século V a.C. como um modelo de gestão político e social de cidades-estados gregas, em especial Atenas que conferia aos seus cidadãos, na época apenas homens atenienses livres e acima de 21 anos, o privilégio de escolher seus governantes.

Este padrão de sufrágio universal se transformou no sistema que garante à sociedade o direito pleno de escolher seus representantes, independente de raça, etnia, sexo ou classe social. A nova democracia no Brasil, por exemplo, é considerada uma das mais avançadas no mundo, mas que embora consolidada não se exclui de falhas, equívocos e de constante aprimoramento e transformações.

O primeiro ministro britânico Winston Churchill, que ganhou notoriedade histórica por sua liderança durante a Segunda Guerra Mundial, é autor da célebre frase: “ - A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor que ela.” O exercício democrático é bastante abrangente, mas tem o voto o ápice de suas aspirações. O poeta Carlos Drummond de Andrade certa vez escreveu: “uma eleição é feita para corrigir o erro da eleição anterior, mesmo que o agrave.”

Especificamente aqui no Brasil, os períodos eleitorais possuem algumas particularidades. De consideráveis demonstrações de absoluto humor com os excêntricos candidatos com suas ‘esquisitices’ até embates que infelizmente culminam em tragédias, fato é que as eleições são capazes de mexer com as emoções e fazer despertar as aspirações mais arcaicas da natureza humana.

 
... é um efeito projetivo daquilo que existe de mais singular
da personalidade de cada um... somos quem votamos?

De ideologias, passando pelas identificações com candidatos ou partidos, aos interesses pessoais ou coletivos, o ato de votar com todos os seus desdobramentos, abarca em si os mais diversos anseios, paixões e motivações que de alguma maneira retrata, ou como se diz psicanalitcamente, é um efeito projetivo daquilo que existe de mais singular da personalidade de cada um. Somos quem votamos?

Para o engrandecimento da democracia, depositar em algumas pessoas a confiança de conduzir os rumos de uma comunidade local, cidade, estado ou nação, implica entre outras coisas, conter distorções muito comuns numa eleição, tais como, votar irracional ou impulsivamente ou ainda mercadejar o voto, alías, prática muito comum nesta época e que
lamentávelmente sepulta a dignidade e o bom caráter.

Se por um lado tem aqueles que votam movidos pelo ardor dos desejos mais irrefreados, e prova disso são as ousadas estratégias de marketing dos candidatos que tentam arrancar dos eleitores risos, lágrimas, amor e ódio, tem por outro os mais racionais munidos de infindos e incansáveis argumentos. Mas há um elemento capaz de equacionar esta lógica emoção-razão para se evitar exageros: o pensar.

 
Sim, para votar é preciso pensar.

Sim, para votar é preciso pensar. Aliás, este é um tema elementar na psicanálise, haja vista que possibilita ao indivíduo, entre outras coisas, o pensar a si e a forma de como expressa isso para o outro. O processo do pensamento permite refrear paixões e adaptar-se à realidade, disse Freud. Autor da Teoria do Pensar, Wilfred Bion, aponta que para além das funções cognitivas a experiência analítica objetiva desenvolver um aparelho mental capaz de pensar emoções.

O fundador da famosa marca automobilística
Henry Ford, disse certa vez que “pensar é o trabalho mais difícil que existe, e talvez por isso que poucos se dediquem a ele.” Leonardo da Vinci teria dito certa vez que ‘quem pensa pouco, erra muito” e a filosofia budista expressa: “ - somos o que pensamos; tudo o que somos surge com nossos pensamentos; e com nossos pensamentos fazemos o nosso mundo”.

Mas afinal, o que é pensar? Pensar é uma palavra originária de um verbo latino pendere, que significa ficar em suspenso, examinar, pesar, ponderar. São Paulo Apóstolo considerou em sua epístola que compete ao homem o examinar-se a si mesmo. Se uma ideia pode ser considerada como uma luz que acende nos porões sombrios da mente, o pensar é seu condutor elétrico. Sem o pensar, não haveria ideias, criatividade, reflexão, discernimento e tampouco civilização.

 
... pensar implica em aprender, aliás, árduo exercício...

Pessoas adoecidas psiquicamente tendem inclusive a ter sua capacidade de pensar bastante comprometida, neste caso, sofrem com seus perturbadores pensamentos sem pensador. Pensar implica em aprender, aliás, árduo exercício. Pode até doer às vezes como desdobramento de como lidamos e suportamos as frustrações, mas sem isso a civilização humana já teria sido absorvida pelas barbáries.

Vamos às urnas. Mas o que e como estamos pensando a respeito disso? Quais os critérios que adotamos para escolher os nossos candidatos? O que se passa pelas nossas mentes diante deste processo? Que percurso foi percorrido em nosso mundo interno para decidirmos por determinado candidato ou candidata? Votaremos mais propensos à emoção ou pela razão? Entre ambas, cabe o pensar. Neste caso, que possamos no pleno exercício de nossa cidadania e pela defesa da nossa democracia, fazer bom e adequado uso do pensamento, votando com reflexão, lucidez e consciência.

Como diz a canção “Quem é essa gente” da banda paulista Bala na Agulha, “somos brasileiros, verdadeiros de coração, dependemos de nós para a próxima eleição, temos que nos ajudar usando a inteligência na hora de votar."

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Marcelo Moya 
é psicanalista, membro do Ékatus Instituto, docente no programa de formação e de cursos de extensão da Escola Paulista de Psicanálise. Reside em Jacarezinho/PR. Atende local e on-line com sessões de análise, espaço de escuta, supervisão clínica, cursos e palestras. www.marcelomoya.com.br. 
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